A
periodização linear ou tradicional é a elaboração de um treinamento que
possui uma fase inicial com alto volume e baixa intensidade, evoluindo para um
aumento da intensidade e redução do volume. Sua teoria é alicerçada no princípio
científico do treinamento esportivo conhecido por interdependência volume x
intensidade, onde cada fase ou período é desenvolvido com o propósito de
ocasionar uma adaptação que irá otimizar os resultados das fases que se
sucedem. Embora alguns autores tenham apresentado aspectos negativos dessa
abordagem (Verkhoshansky, 2001 apud Gentil, 2005), vários outros, como Fleck
& Kraemer (1999), já demonstraram o quão eficiente a periodização pode
ser no incremento da força muscular.
Mas,
e quanto à hipertrofia? Como funciona a periodização aplicada a um programa
elaborado para o aumento da massa muscular? Antes de respondermos a esta
pergunta, é necessário fazer justiça a quem seja, muito provavelmente, o
maior responsável pela aplicação da periodização ao treinamento de força
voltado para hipertrofia, o romeno Tudor Bompa, que em 1998 publicou Serious
Strength Training e transportou o rígido conceito da periodização linear para
esporte que se define pela máxima hipertrofia muscular possível, o culturismo.
No Brasil, este livro foi publicado em 2000 com o título de Treinamento de Força
Consciente.
Vários
autores conceituados como o inglês William Kraemer e o russo Yuri Verkhoshansky
já haviam demonstrado os resultados da periodização aplicada ao treinamento
de força no treinamento esportivo, todavia, a hipertrofia é uma alteração
morfológica, e não uma capacidade física que depende de algum tipo de
requisito motor específico. No caso do treinamento de hipertrofia a periodização
serviria apenas para definir critérios técnicos onde até então não havia
nenhum (Gentil (2005).
Desta
maneira, quais seriam, então, os erros mais comuns na abordagem linear da
periodização aplicada ao treinamento de força para hipertrofia? Das seis
fases definidas por Bompa, comentaremos aquelas que induzem aos maiores
problemas na sua aplicação:
Fase da
Adaptação Anatômica: esta fase pressupõe que indivíduos sem experiência
e aqueles que estão retornando de um longo tempo de inatividade, devem passar
por um período de treinamento que desenvolva os tendões e ligamentos, uma vez
que a “velocidade” de fortalecimento destas estruturas não contateis é
menor que a do tecido muscular esquelético. Assim, segundo Bompa, os treinos
desta fase devem possuir baixo volume e intensidade mesmo havendo evidências de
que treinos de alta intensidade, em curto prazo, não são lesivos se
respeitados os critérios de volume e técnicas corretas de levantamento
(Gentil, 2005: 152).
Fase de
Força Máxima: Bompa (2000), afirma que esta fase tem como objetivo o
aumento da espessura das pontes cruzadas e dos filamentos grossos de miosina, única
maneira de estimular a hipertrofia crônica. Contraditoriamente, não há evidências
científicas de que seja necessário promover um aumento na força para que se
desenvolva a hipertrofia muscular, o que torna esta fase, no mínimo, desnecessária.
Outro problema esta no termo hipertrofia crônica, usado por Bompa como sinônimo
de hipertrofia miofibrilar, que só ocorreria com protocolos onde as repetições
fossem baixas e as cargas altas, fatores responsáveis pelo real aumento da força
muscular. Já vimos, aqui no GEASE, que a existência de dois tipos de
hipertrofia não procede cientificamente. Talvez tenha sido um recurso didático
usado pelos russos (primeiros a abordar o termo miofibrilar e sarcoplasmático,
na hipertrofia fisiológica do músculo esquelético) mal interpretado por
alguns treinadores ocidentais (Gentil, 2005).
Fase de
Definição: basta entendermos os conceitos básicos da fisiologia aplicada
ao exercício físico para nos darmos conta de que treinos para “definição”,
no treinamento de força, não possuem fundamento. Mesmo assim, Bompa chega a
dizer que o alto número de repetições, usados nesta fase, faz com que o corpo
utilize os ácidos graxos como fonte de energia para contração muscular, dando
a entender que há redução localizada de gordura subcutânea, “definindo”
os músculos. Tanto o modelo matemático, quanto o metabólico, da redução de
peso corporal não encontram evidências o suficiente que os sustentem. Mesmo não
existindo provas que a “definição” anule a hipertrofia, e vice versa, o
que distingue verdadeiramente os dois protocolos são as estratégias
nutricionais e o uso de fármacos, como lembra Gentil (2005). Simplificar a redução
de gordura corporal, manipulando apenas um certo número de repetições, mesmo
aliados a uma mudança dietética, e não considerar a complexidade de um
sistema não-linear, como o corpo humano é, no mínimo, imprudente.
Fase de Transição:
esta fase parte da premissa de que é necessário reduzir a sobrecarga imposta
pelo treinamento ao final do ciclo anual, assim como entre as demais fases, a
fim de evitar o surgimento da fadiga crônica e/ou síndrome do overtraining.
Porém, a rigidez, ou inflexibilidade desta fase não considera que outros
aspectos podem induzir a tais situações e não somente o treino em si, não
permitindo que esta fase se adeque a outros períodos elaborados dentro do ciclo
anual. Outra grave falha apontada por Gentil (2005), é que a fase de transição
sucede a fase de adaptação anatômica, ocasionando um ciclo estendido de
adaptação - transição, interrompendo demasiadamente o processo de
hipertrofia gerado pelo treino.
Atualmente, a hipertrofia
como resultado do treinamento de força vem recebendo mais atenção da
comunidade científica, com mais e mais estudos a cerca deste tema. A
complexidade deste processo adaptativo impede que abordagens lineares sejam
aplicadas sem uma análise mais profunda e criteriosa, como se a
resposta dependesse apenas de uma regra básica, como propõe a periodização
apresentada por Bompa. Não há, e talvez nunca haja, um modelo pronto para
responder a todas a necessidades do treinamento de força voltado para
hipertrofia analisar e entender o que estas necessidades querem dizer seja
atitude mais acertada.
Referências
Bibliográficas
BOMPA, T; CORNACCHIA, L. Treinamento de Força Consciente. Phorte,
2000.
FLECK, WJ; FLECK, SJ. Fundamentos do Treinamento de Força Muscular.
Artmed, 1999.
GENTIL, P. Bases Científicas do Treinamento de Hipertrofia. Sprint, 2005
0 comentários:
Postar um comentário